CANÇÃO DO PASTOR
Deus fala comigo a horas mortas
Não quer olhar o vulto impuro de ninguém
Por isso, vem
Quando se fecham as portas
Os ralos cantam nas hortas
E se espalha a noite pela serra além
Desgarrado, numa corte ao lado
Um bezerro berra
Se à tona da terra acaso andar alguém
Quando se abre ao silêncio a solidão da serra
E quando tudo mais iníquo encerra
Então Deus não vem...
Dorme a vida no seio da noite
Como um menino no colo da mãe
Espero-o só, além dos povoados
Nas charnecas e montados
Num cenário espectral de silêncios e de enredo
Deus vem!... Mas não diz nenhum segredo
Pela noite fora, pelo céu além
Vai de mim luminoso para os astros
Num esplendor de sideral fulguração
Tal era tal fiquei
Lameiros pastos, o gado, a terra, o húmus, a germinação
Ah, que Deus engana e desengana.
O tudo transformado em seiva e em chão!
Serena etérea vida além da Vida!...
Não durmas, coração.
In “Jornal dos Poetas & Trovadores”
Ano XIX 3ª Série n.º 10
Maio/Junho de 1999
Agostinho de Mello Júnior
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