15.
Há um cabo a dobrar dentro do sangue
após o canto os cânticos há cabos que dobrar
é dar o sangue por causas carregadas
de utopias causas que sabemos mortais
de mortes naturais há um cabo a
transpor ao sol poente gasto de alegria
que outrora grassava neste mar vivo e
tão vivido que se chamava vida se
vida é nome a dar a qualquer coisa mais
correspondente do que isto que sentimos
do que isto de saber haver um cabo
ao fim da terra onde a esperança finda
e o tumulto das vagas arremete
contra o último reduto o súbito
crepúsculo que se salva se há um cabo
um promontório donde tudo se avista
onde ninguém nos avista nem o sangue
em cujo leito o tal cabo se pranta e
nunca se dobra por mais que se insista.
In “A Única Estação”
Edições Quasi
Nuno de Figueiredo
N. 1943
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