Quarta-feira, 28 de Maio de 2014

Eu li... Murilo Mendes

SOMOS TODOS POETAS

 

Assisto em mim a um desdobrar de planos.
as mãos vêem, os olhos ouvem, o cérebro se move,
A luz desce das origens através dos tempos
E caminha desde já
Na frente dos meus sucessores.

Companheiro,
Eu sou tu, sou membro do teu corpo e adubo da tua alma.
Sou todos e sou um,
Sou responsável pela lepra do leproso e pela órbita vazia do cego,
Pelos gritos isolados que não entraram no coro.
Sou responsável pelas auroras que não se levantam
E pela angústia que cresce dia a dia.

 

In “Poesia Completa e Prosa”

Editora Nova Aguilar – Rio de Janeiro

 

Murilo Mendes

(Poeta Brasileiro)

1901 – 1975

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Sexta-feira, 23 de Maio de 2014

Eu li... Saul Dias

ESCREVER UM LIVRO, CRIAR UM FILHO,

PLANTAR UMA ÁRVORE

 

Escrevi um livro.

Quantos anos a sonhá-lo,

A rascunhá-lo nas mesas dos cafés,

A escrevê-lo nos intervalos do emprego,

A vivê-lo,

A sofrê-lo,

Na província, nas cidades...!

 

Criei um filho.

Tanta alegria no meu coração!

 

Só ainda não plantei uma árvore.

O frágil caule como protegê-lo?

Como não deixar que os bichos

Maculem as pequeninas folhas?

E como dialogar com uma árvore-menina? 

 

Agora vai sendo tempo.

Os anos já me pesam.

Amanhã vou plantar uma árvore.

 

In “Essência”

Brasília Editora – 1973

 

Saul Dias **

1902 – 1983

 

**pseudónimo de Júlio Maria dos Reis Pereira

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Domingo, 18 de Maio de 2014

Eu li... Francisco de Pina e Melo

FRAGILIDADE DO ALÍVIO

 

Se me ponho quieto, e pensativo;

Com memórias a ideia fatigando,

Sobra à Morte o andar escogitando

Para acabar-me a vida, outro motivo.

 

Antes de tantas lástimas cativo,

Por tantos casos míseros passando,

Não sei como em meus males contemplando.

De peso tão profundo escapo vivo.

 

Só tenho algum alívio enquanto dura

A quimera de um vago pensamento

Que aéreas esperanças me assegura:

 

Triste alívio! infeliz contentamento!

Que para sustentar minha ventura,

Não tem mais cabedal, que o fingimento.

 

In “As Rimas” – 1717 

Off. de Joseph Antunes da Sylva – Coimbra

 

Francisco de Pina e Melo

1695 – 1773

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Terça-feira, 13 de Maio de 2014

Eu li... Agostinho da Silva

SOU MARUJO, MESTRE E MONGE

 

Sou Marujo, Mestre e Monge

marujo de águas paradas

mas que levam os navios

às terras por mim sonhadas

 

Também sou mestre de escola

em que toda a gente cabe

se depois de estudar tudo

sentir bem que nada sabe

 

Mas nem terra ou mar me prendem

e para voar mais longe

do mosteiro que não houve

e não haja, me fiz monge

 

In "Uns Poemas de Agostinho"

Ulmeiro – 1989  

 

Agostinho da Silva

1906 – 1994

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Quinta-feira, 8 de Maio de 2014

Eu li... Auta de Souza

NO JARDIM DAS OLIVEIRAS

 

“Minh’ alma é triste até à morte...” Doce,

Jesus falou... E o Nazareno santo

Chorava, como se a su’alma fosse

Um mar imenso de amargura e pranto.

 

Depois, silencioso, ele afastou-se

E foi rezar no mais sombrio canto.

Seu grande olhar formoso iluminou-se

Fitando o etéreo e estrelejado manto.

 

“Pai, tem piedade...” E sua vez plangente

Tremia, enquanto pelas trevas mudas

Baixava manso o triste olhar dolente.

 

Pobre Jesus! Como n’um sonho via:

Em cada sombra a traição de Judas,

Em cada estrela os olhos de Maria!

 

In “Horto” 1900

 

Auta de Souza

1876 – 1901 

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Sábado, 3 de Maio de 2014

Eu li... Viriato da Cruz

NAMORO

 

Mandei-lhe uma carta em papel perfumado

e com a letra bonita eu disse ela tinha

um sorrir luminoso tão quente e gaiato

como o sol de Novembro brincando de artista nas

[acácias floridas

espalhando diamantes na fímbria do mar

e dando calor ao sumo das mangas

Sua pele macia - era sumaúma...

Sua pele macia, da cor do jambo, cheirando a rosas

tão rijo e tão doce - como o maboque...

Seus seios laranjas - laranjas do Loge

seus dentes... - marfim...

Mandei-lhe uma carta

e ela disse que não.

Mandei-lhe um cartão

que oamigo  Maninho tipografou:

"Por ti sofre o meu coração"

Num canto - SIM, noutro canto - NÃO

E ela o canto do NÃO dobrou.

Mandei-lhe um recado pela Zefa do Sete

pedindo rogando de joelhos no chão

pela Senhora do Cabo, pela Santa Ifigénia,

me desse a ventura do seu namoro...

E ela disse que não.

 

Levei à avó Chica, quimbanda de fama

a areia da marca que o seu pé deixou

para que fizesse um feitiço forte e seguro

que nela nascesse um amor como o meu...

E o feitiço falhou.

 

Esperei-a de tarde, à porta da fábrica,

ofertei-lhe um colar e um anel e um broche,

paguei-lhe doces na calçada da Missão,

ficamos num banco do largo da Estátua,

afaguei-lhe as mãos...

falei-lhe de amor... e ela disse que não.

Andei barbado, sujo, e descalço,

como um mona-ngamba.

Procuraram por mim

" - Não viu...(ai, não viu...?) Não viu Benjamim?"

E perdido me deram no morro da Samba.

Para me distrair

levaram-me ao baile do sô Januário

mas ela lá estava num canto a rir

contando o meu caso às moças mais lindas do Bairro

[Operário

 

Tocaram uma rumba - dancei com ela

e num passo maluco voamos na sala

qual uma estrela riscando o céu!

E a malta gritou: "Aí Benjamim!"

Olhei-a nos olhos - sorriu para mim

pedi-lhe um beijo - e ela disse que sim.

 

In “Poemas de Amor”

Versões Ana Leal

Edição Alma Azul – Janeiro.2006

 

Viriato da Cruz

(Poeta Angolano)

1928 – 1973

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