PRESSÁGIOS
Quando eu nasci, tocava o fogo
Na minha freguesia,
E um meu vizinho, que perdera ao jogo,
Golpeava as veias, quando eu nascia.
Chegando ao mundo, comigo vinha
Uma irmãzinha,
Pó que, mudado em flor, voltou logo a ser pó…
E eu comecei, chegando ao mundo, a ver-me só…
A linda gémea, que Deus me dera,
Logo morria, mal nascera,
Morria logo…
Na freguesia, tocava a fogo…
Com tais avisos, com tais presságios,
Breve me afiz a padecer, sem protestar,
Ódios, tormentos, decepções, lutos, naufrágios,
Os idos, os de agora e os mais que hão-de chegar.
In “Antologia”
INCM – Lisboa – 1987
Eugénio de Castro
1869 – 1944
COR-RESPONDÊNCIA
Remeta-me os dedos
em vez de cartas de amor
que nunca escreves
que nunca recebo.
Passeiam em mim estas tardes
que parecem repetir
o amor bem feito
que voce tinha mania de fazer comigo.
Não sei amigo
se era o seu jeito
ou de propósito
mas era bom, sempre bom
e assanhava as tardes.
Refaça o verso
que mantinha sempre tesa
a minha rima
firme
confirme
o ardor dessas jorradas
de versos que nos bolinaram os dois
a dois.
Pense em mim
e me visite no correio
de pombos onde a gente se confunde
Repito:
Se meta na minha vida
outra vez meta
Remeta.
Elisa Lucinda
(Jornalista e Poetisa Brasileira)
N. 1958
TODA A VIDA
Primavera! Aí vem ela –
Florida, luminosa e atraente!
As árvores enchem-se de folhas
E essas folhas como lábios
Tocam-se amorosamente!
À noite, as estrelas, dizem
Segredos aos namorados.
Primavera! Não acordes
Esta saudade, não fales,
Deixa ouvir os trinados
Da vida que nasce e canta
Para ficar mais imensa
Nos silêncios da ilusão!
Se ela aí vem, não te oponhas:
– Deixa-a passar, coração!
In “Canções”
António Botto
1897 – 1959
MEU DESTINO
Nas palmas de tuas mãos
leio as linhas da minha vida.
Linhas cruzadas, sinuosas,
interferindo no teu destino.
Não te procurei, não me procurastes –
íamos sozinhos por estradas diferentes.
Indiferentes, cruzamos
Passavas com o fardo da vida...
Corri ao teu encontro.
Sorri. Falamos.
Esse dia foi marcado
com a pedra branca
da cabeça de um peixe.
E, desde então, caminhamos
juntos pela vida...
Cora Coralina *
(Poetisa Brasileira)
1889 – 1985
*(Pseudónimo de Ana Lins dos Guimarães Peixoto Bretas)
É MAIS UM
Tu que tanto prometias
Nada tinhas para dar
Eu sei bem que tu mentias
Pois tudo quanto dizias
Era só para enganar.
Porque eras aldrabão
Porque enganavas o povo
Era assim que tu mentias,
Tantas promessas fazias
Só para seres homem famoso.
Mas nunca lá chagarás
Nem sempre sabes mentir
Eu até me fico a rir,
Só se deve prometer
O que se pode cumprir.
Mas para ti não importa
Vires a cumprir ou não
Pois todos nós já sabemos,
Por vezes até sofremos
Por tu seres tão aldrabão.
In “Revista Unearta”
N.º 13 - Ano 2 - Janeiro.2003
José Ferreira Veigas
(Poeta – Pastor)
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