MENINO JESUS
Tuas mãos tudo partilham
do Todo que nos trouxeste.
Teus olhos, felizes, brilham
pelo “Sim” que ao Pai disseste.
Simples, meigo, despojado
para vestir nossa veste,
Tu és o Deus humanado
que nosso Irmão te fizeste.
Jesus Menino em Belém,
em Nazaré Tu cresceste;
homem, em Jerusalém
morte injusta padeceste.
Salvador de todo o povo
sem distinção, que nos deste
a esperança de um Mundo Novo,
bem-vindo porque vieste!
Frei Lopes Morgado
(Inspirado na imagem do Menino feita pelas Irmãzinhas de Jesus)
ESTES SÍTIOS
Olha bem estes sítios queridos,
Vê-os bem neste olhar derradeiro...
Ai! o negro dos montes erguidos,
Ai! o verde do triste pinheiro!
Que saudades que deles teremos...
Que saudade; ai, amor, que saudade!
Pois não sentes, neste ar que bebemos,
No acre cheiro da agreste ramagem,
Estar-se alma a tragar liberdade
E a crescer de inocência e vigor!
Oh! aqui, aqui só se engrinalda
Da pureza da rosa selvagem,
E contente aqui só vive Amor.
O ar queimado das salas lhe escalda
De suas asas o níveo candor,
E na frente arrugada lhe cresta
A inocência infantil do pudor.
E oh! deixar tais delícias como esta!
E trocar este céu de ventura
Pelo inferno da escrava cidade!
Vender alma e razão à impostura,
Ir saudar a mentira em sua corte,
Ajoelhar em seu trono à vaidade,
Ter de rir nas angústias da morte,
Chamar vida ao terror da verdade...
Ai! não, não... nossa vida acabou,
Nossa vida aqui toda ficou.
Diz-lhe adeus neste olhar derradeiro,
Diz à sombra dos montes erguidos,
Di-lo ao verde do triste pinheiro,
Di-lo a todos os sítios queridos
Desta rude, feroz soledade,
Paraíso onde livres vivemos,
Oh! saudades que dele teremos,
Que saudade! ai, amor, que saudade!
Folhas Caídas – 1853
In “SIGNOS”
Lisboa Editora
Almeida Garrett
PARA AQUÉM DE ABRIL
Entardeceram
nos umbrais da aurora
as memórias do teu rosto
Abril...
Nunca mais soprou o vento
depois
de Novembro
a vida
petrificou-se na inconstância
do rio...
não mais navegam
o teu sorriso
de florestas virgens
Hoje
passeio atónito
na neblina
das montanhas
fluir no tempo
na inércia da aventura
sonhar parado
no caminho em movimento
vir à estrada
e saber oscilar no horizonte
ser a terra
o mar
o sol
e a boca
cantar poema aberto
esperança viva
olhar o homem disperso
e cantá-lo
com a herança do ventre
reinvento-me
e não passo da superfície
deste mar austero
nos flancos do dia
arde o inatingível
torno a inventar
(o desfraldar das areias
vai-se consumindo
até que o sol nasça)
In “Afluentes de Liberdade”
Edições Milho-Rei
Francisco Duarte
AGARRA O TEMPO
O momento é fugaz e passageiro
de aroma caduco embebido.
Corre, luta, conquista-o primeiro!
Ou, antes que chegues, já terá ido…
A vida nunca espera por ti
numa esquina qualquer parada.
Há vivos que já dizem: “Eu morri”!
Porque, de vontade, não têm anda.
Agarra hoje o que chamas tempo.
Caminha com a vista no amanhã.
É fugaz e passageiro o momento.
Já, era ontem perdido no tempo.
E o futuro, dia de amanhã,
vem apressado, correndo no vento...
In “Fátima Missionária”
Paula Alexandra Faustino
O PRESIDIÁRIO
À minha frente, grades enormes
Ao sul cortinas de tijolos queimados
A luz em conta-gotas invade pela fresta
Sem nenhuma alegria o sol, penetra.
Neste sub mundo imundo onde vivo
Sonhos de liberdade invento
Intenção minha passar rápido o tempo
E a dor da tristeza do isolamento.
Nas paredes sujas rabiscadas
Uma mensagem de amor me acalenta...
Que injustiça essa justiça
Lacra-me e o criminoso inocenta.
Meus pensamentos navegam distantes
Na incerteza de um dia poder provar:
Sou inocente, sob tortura confessei.
Esperança no resultado do DNA.
Neste cárcere a traçar planos inatingíveis
Embalando a agonia de minha sina
Nada acontece, tudo se cala
Sentença longa me alucina.
Solidão que me consome o coração
Sem minha família, longo deserto
Tudo tão longe, mesmo tão perto.
Desmembrado rejeito a própria vida.
Nesta desilusão infinita
Sem luz e sem luar
Viver para quê? Para quem?
Digo adeus, vou para o além.
Novembro 2001
Juraci de Oliveira Chaves
(Poetisa Brasileira)
FUGAZ
passagem por uma paisagem,
lugar do onde, do ontem, do quando,
quantas palavras ficaram faltando
na boca cheia de imagens.
o outro é aquele que ficou à margem,
no espanto de um pronome,
no corpo de uma brisa suave;
o outro é como uma fome
pluma à deriva, à distância, ou quase.
estranho em sua própria viagem,
garrafa com uma mensagem,
olhar durando numa flor,
sem nome, secreta, selvagem.
Desterro, água bebida num trem,
peça incompleta, festa adiada, vertigem,
a cabeça sempre em alguém,
eu outro, eu todos, ninguém.
VISIBILIA
In “Poemas 1994 –
Sette Letras – RJ – Brasil
Rodrigo Garcia Lopes
(Jornalista e escritor brasileiro)
XADREZ
É branca a gata gatinha
é branca como farinha.
É preto o gato gatão
é preto como carvão.
E os filhos, gatos gatinhos,
são todos aos quadradinhos.
Os quadradinhos branquinhos
fazem lembrar mãe gatinha
que é branca como a farinha.
Os quadradinhos pretinhos
fazem lembrar pai gatão
que é preto como o carvão.
Se é branca a gata gatinha
e é preto o gato gatão,
como é que são os gatinhos?
– os gatinhos eles são,
são todos aos quadradinhos.
In “A Televisão da Bicharada”
Sidónio Muralha
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