INTERIOR
Chora o menino a quem morreu o Pai,
Porque o Par do menino já chorou,
Naquela tarde — Há quanto tempo vai! —
Em que morreu o Avô.
— Morreste, Pai?
— Filho, morri.
— Sofreste, Pai?
— Filho, sofri.
— E ouve, Paizinho, a morte que tal é?
— Meu filho, a morte «não é».
Chora o menino, fecham-se as janelas,
Mas em compensação
Há mais claridade nas estrelas!
— Morreste, Pai?
— Filho, morri.
— Sofreste, Pai?
— Filho, sofri.
— E ouve, Paizinho, a morte que tal é?
— Meu filho, a morte «não é».
Tem o menino uma expressão aflita!
Numa cadência abstrata,
Sôbre uma salva de prata,
Deitam cartões de vizita
As pessoas importantes,
Pois logo naquele dia
Vieram os representantes
Da Junta de Freguezia.
São quatro horas — tao cedo!
Nem uma réstea de sol!
E o menino sente medo
De levantar o lençol!
Já duas vezes tentou,
E vai tentá-lo outra vez,
Mas consegue ver-lhe só
Como tem hirtos os pés!
Desiste, não tem coragem,
Uma invisível barragem
Não o deixa prosseguir —
Que triste Alcácer-Quibir!
Quem lhe dera expulsar aquela gente
Que apenas por vício
Vem fazer oficio
De corpo presente...
Por cima dos balcões,
Tantos remédios, tantas injecções,
Tantas ventosas, tantos cataplasmas,
Ao menino parecem-lhe fantasmas!
— Morreste, Pai?
— Filho, morri.
— Sofreste, Pai?
— Filho, sofri.
— E ouve, Paizinho, a morte que tal é?
— Meu filho, a morte «não é».
In “Altura Cadernos de Poesia” I
Casa do Castelo, Editora, Coimbra – Fevereiro de 1945
Noel de Arriaga
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