Quarta-feira, 30 de Março de 2016

Eu li... Judith Teixeira

DELÍRIOS RUBROS

 

Quebro as nervos teu torturas

como contas ressequidas,

crispados por amarguras

nas minhas noites perdidas!

 

Ando na vida às escuras...

Se estendo as mãos doloridas,

abrasam-me mordeduras

de bocas encandescidas!

 

Sempre a fúria dos desejos,

a gritar pelos teus beijos

incendiando o meu sangue...

 

Traz-me o vento em seus clamores

presságios de novas dores —

e eu fico desfeita, exangue!

 

In “Decadência”

 

Judith Teixeira **

(1880-1959)

 

** Judite dos Reis Ramos Teixeira

publicado por cateespero às 00:00
link do post | Deixe seu comentário | favorito
Domingo, 20 de Março de 2016

Eu li... Fernanda de Castro

MEDITAÇÃO

 

Esta noite foi longa. Longa e vária

de segredo e mistério. Noite densa.

Invisível, tirânica presença

povoou a minha noite solitária.

 

Ah, a insónia com longas mãos de opala

e fundos olhos cegos!

E o pensamento à solta como o vento

- montes e vales, oceanos, pegos!...

e a cabeça que estala,

a cabeça que estala!

 

Pensar! Como se o humano entendimento

para tanto chegasse! Meditar

em sofás de ridículas saletas

no sábio movimento dos planetas.

Filosofar, oh irrisão,

enquanto mal ou bem

se faz a digestão,

sobre a morte, o devir,

o mistério do ser e do não ser,

e tudo isto a sério, sem sorrir,

como se enfim tudo estivesse dito:

o Caos, a Criação, Deus e o Infinito.

E nem sequer escondes por decoro,

triste mortal com asas de besouro,

ó depenado arcanjo,

que te crês Deus ou pelo menos anjo.

 

Esta noite foi longa. Longa em mim,

auroral e lunar, sem princípio nem fim.

Meditação

inútil sobre as grades da prisão.

Meditação sobre a existência,

(Existirá ou não?,

ou será tudo simples aparência,

colectiva ilusão?)

 

Esta noite foi longa. Longa e bela,

calma e branca vigília.

Um fio de luar entrou pela janela

e um doce cheiro a tília.

Abstracções metafísicas, problemas?

O firmamento era um brocado azul bordado a ouro,

fabuloso tesouro

de incomparáveis gemas.

Tudo era silêncio, quietação.

Compreendi então

que o essencial não era compreender

mas sentir e aceitar

a vida e a morte, o bem e o mal,

a flor, o luar

e a ignorância total.

Não mais filosofias de vaidoso esteta

e não mais este orgulho: sou poeta.

Razão

tem-na, talvez, o louco sem razão,

tem-na o monge na cela,

o cego de nascença, a pedra, o sapo,

a boneca de trapo.

O mais é tudo igual: poetas, corifeus...

 

Esta noite foi longa. Longa e bela.

Encontrei Deus.

 

In “Exílio”

 

Fernanda de Castro

(1900-1994)

publicado por cateespero às 00:00
link do post | Deixe seu comentário | favorito
Quinta-feira, 10 de Março de 2016

Eu li... António de Sousa

ESQUEMA

 

ASA - Mas não de perto,

que de perto não vôo,

vou de rastos.

Anjo deserto,

são as asas, primeiro, que me rôo

ao silêncio dos astros.

 

(Quanto pode esta fome de viver

que de mim se sustenta e me sustém!

Tudo o que é não-morrer

me sabe bem).

 

In “Linha de Terra”

Editorial Inquérito – 1952

 

António de Sousa

(1898-1981)

publicado por cateespero às 00:00
link do post | Deixe seu comentário | favorito

.Eu

.pesquisar

 

.Maio 2017

Dom
Seg
Ter
Qua
Qui
Sex
Sab
1
2
3
4
5
6
7
8
9
10
11
12
13
14
15
16
17
18
19
20
21
22
23
24
25
26
27
28
29
30
31

.posts recentes

. Eu li...

. Eu li... Olavo Bilac

. Eu li... António Botto

. Eu li... Charles Baudelai...

. Eu li... Su Dongbo

. Eu li... Jacinta Passos

. Eu li... Laura Riding

. Eu li... Carlos Drummont ...

. Eu li... Juan Ramón Jimén...

. Eu li... Vincenzo Cardare...

.arquivos

. Maio 2017

. Abril 2017

. Março 2017

. Fevereiro 2017

. Janeiro 2017

. Dezembro 2016

. Novembro 2016

. Outubro 2016

. Setembro 2016

. Agosto 2016

. Julho 2016

. Junho 2016

. Maio 2016

. Abril 2016

. Março 2016

. Fevereiro 2015

. Janeiro 2015

. Dezembro 2014

. Novembro 2014

. Outubro 2014

. Setembro 2014

. Agosto 2014

. Julho 2014

. Junho 2014

. Maio 2014

. Abril 2014

. Março 2014

. Fevereiro 2014

. Janeiro 2014

. Dezembro 2013

. Novembro 2013

. Outubro 2013

. Setembro 2013

. Agosto 2013

. Julho 2013

. Junho 2013

. Maio 2013

. Abril 2013

. Março 2013

. Fevereiro 2013

. Janeiro 2013

. Dezembro 2012

. Novembro 2012

. Outubro 2012

. Setembro 2012

. Agosto 2012

. Julho 2012

. Junho 2012

. Maio 2012

. Abril 2012

. Março 2012

. Fevereiro 2012

. Janeiro 2012

. Dezembro 2011

. Novembro 2011

. Outubro 2011

. Setembro 2011

. Agosto 2011

. Julho 2011

. Junho 2011

. Maio 2011

. Abril 2011

. Março 2011

. Fevereiro 2011

. Janeiro 2011

. Dezembro 2010

. Novembro 2010

. Outubro 2010

. Setembro 2010

. Agosto 2010

. Julho 2010

. Junho 2010

. Maio 2010

. Abril 2010

. Março 2010

. Fevereiro 2010

. Janeiro 2010

. Dezembro 2009

. Novembro 2009

. Outubro 2009

. Setembro 2009

. Agosto 2009

. Julho 2009

. Junho 2009

. Maio 2009

. Abril 2009

. Março 2009

. Fevereiro 2009

. Janeiro 2009

. Dezembro 2008

. Novembro 2008

. Outubro 2008

. Setembro 2008

. Agosto 2008

. Julho 2008

. Junho 2008

. Maio 2008

. Abril 2008

. Março 2008

.tags

. todas as tags

blogs SAPO

.subscrever feeds