AQUELES OLHOS, QUE EU DEIXEI CHORANDO
Aqueles olhos, que eu deixei chorando,
Cujas formosas lágrimas bebia
Amor, com as suas tendo companhia,
Ante os meus se em vão representando.
Os saudosos suspiros, que arrancando
Das almas, em que da troca Amor fazia,
Que a que ficava, era a que partia,
E a que ia, a ficava acompanhando,
Aquelas brandas, mal pronunciadas
Palavras da saudosa despedida
Entre lágrimas rotas, e quebradas,
E aquelas alegrias esperadas
Da boa tornada, já antes da partida,
Vivas as trago, não representadas.
In “Poemas Lusitanos” – 1598
Mandado publicar por seu filho, Miguel Leite Ferreira
António Ferreira
1528 – 1569
"QUEM A TEM..."
Não hei-de morrer sem saber
Qual a cor da liberdade.
Eu não posso senão ser
Desta terra em que nasci.
Embora ao mundo pertença
E sempre a verdade vença,
Qual será ser livre aqui,
Não hei-de morrer sem saber.
Trocaram tudo em maldade,
É quase um crime viver.
Mas embora escondam tudo
E me queiram cego e mudo,
Não hei-de morrer sem saber
Qual a cor da liberdade.
In “Fidelidade”
Jorge de Sena
1919 – 1978
INÊS DE MANTO
Teceram-lhe o manto
para ser de morta
assim como o pranto
se tece na roca
Assim como o trono
e como o espaldar
foi igual o modo
de a chorar
Só a morte trouxe
todo o veludo
no corte da roupa
no cinto justo
Também como o choro
lhe deram um estrado
um firmal de ouro
o corpo exumado
O vestido dado
como o choravam
era de brocado
não era escarlata
Também de pranto
a vestiram toda
era como um manto
mais fina que a roupa
In “Barcas Novas”
Editora Ulisseia
Fiama Hasse Pais Brandão
1938 – 2007
ALVORADA
Morrem no céu a últimas estrelas,
Finda Brumosa a noite azul de maio...
E sons esparsos de aves tagarelas,
Cantam baixinho, como num ensaio!
Pintam-se, do horizonte nas ourelas
As curvas da montanha, a um dúbio rio,
E a noite, com seu manto de cautelas,
Desfalece num lírico desmaio.
O céu, então, se banham de livores,
Dissipam-se as neblinas pelo vento,
Evola-se o perfume de mil flores!
E a natureza, noiva descuidada,
Acordada, num bocejo sonolento,
Ao beijo cintilante da alvorada!
In “A poesia de Massillon Machado”
Massillon Machado
(Poeta Brasileiro)
1899 – 1972
MEU QUASE SEXTO SENTIDO
Por detrás da névoa incerta,
Da bruma desconcertante,
Há uma verdade encoberta,
Que é, por trás da névoa incerta,
Intemporal e constante.
Oh névoa! Oh tempo sem horas!
Oh baça visão instável!
Que mal meus olhos afloras,
Em vão transmutas, descoras...
Meu olhar é infatigável.
Quero saber-me quem sou
Para além do que pareço
Enquanto não sei e sou!
Nuvem que a mim me ocultou,
Ai! Meramente aconteço.
Com menos finalidade
De que uma folha caída
Na boca da tempestade,
Porque ele é, na verdade,
Morte a caminho da Vida;
E eu não sei donde venho
Nem sei, sequer, p'ra aonde vou.
Rompa-se a névoa encoberta!
Quero saber-me quem sou!
Livro I - Um voo cego a nada
In “Poemas”
Reinaldo Ferreira
1922 – 1959
EXTREMO
o extremo
da generosidade
e da arrogância
faz
com que
cada
um
seja
benditamente
mais estúpido
do que
o
outro
seja,
um,
cada um,
benditamente,
mais
tonto
que
o outro
In “Todos os sonhos. Antologia da Poesia Moderna Angolana”
União dos Escritores Angolanos
Carla Queiroz
(Poetisa Angolana)
N. 1968
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