Quarta-feira, 28 de Março de 2012

Eu li... Bruna Lombardi

CIO

Quero dormir com você ou pelo menos
te dar um beijo na boca
o meu amor não tem pudor, nem acanhamento
não tem paciência, não aguenta mais
a urgência do desejo
e eu te olho, te olho, te olho
como se dissesse.

Penso ele há de perceber, me encosto um pouco
espero um gesto, um sinal, uma atitude
que eu possa interpretar como resposta
uma indicação
mas você é um homem sério e continua
se escondendo atrás dessas teorias
e nem te brilha no olho uma faísca de tentação.

Aí que aflição
pensar no que eu faria
se pudesse

desejo que não acontece
fica parado no peito
aí, vira obsessão.

 

In “O Perigo do Dragão”

Editora Record

 

Bruna Lombardi

(Escritora Brasileira)

N. 1952

publicado por cateespero às 00:00
link do post | Deixe seu comentário | favorito
Sexta-feira, 23 de Março de 2012

Eu li... Vinicius de Moraes

A PÊRA

 

Como de cera
E por acaso
Fria no vaso
A entardecer

A pêra é um pomo
Em holocausto
À vida, como
Um seio exausto

Entre bananas
Supervenientes
E maçãs lhanas

Rubras, contentes
A pobre pêra:
Quem manda ser a?

 

 

In “Operário em Construção e Outros Poemas”

Colecção Poesia Século XX – 5ª Edição (1976)

Publicações D. Quixote

 

Vinicius de Moraes

1913 – 1980

(Poeta Brasileiro)

 

publicado por cateespero às 00:00
link do post | Deixe seu comentário | ver comentários (1) | favorito
Domingo, 18 de Março de 2012

Eu li... Cesário Verde

A DÉBIL

 

Eu, que sou feio, sólido, leal,
A ti, que és bela, frágil, assustada,
Quero estimar-te sempre, recatada
Numa existência honesta, de cristal.

Sentado à mesa dum café devasso,
Ao avistar-te, há pouco, fraca e loura,
Nesta Babel tão velha e corruptora,
Tive tenções de oferecer-te o braço.

E, quando socorreste um miserável,
Eu, que bebia cálices de absinto,
Mandei ir a garrafa, porque sinto
Que me tornas prestante, bom, saudável.

"Ela aí vem!" disse eu para os demais;
E pus-me a olhar, vexado e suspirando,
O teu corpo que pulsa, alegre e brando,
Na frescura dos linhos matinais.

Via-te pela porta envidraçada;
E invejava, — talvez que não o suspeites! -
Esse vestido simples, sem enfeites,
Nessa cintura tenra, imaculada.

Ia passando, a quatro, o patriarca.
Triste eu saí. Doía-me a cabeça.
Uma turba ruidosa, negra, espessa,
Voltava das exéquias dum monarca.

Adorável! Tu, muito natural,
Seguias a pensar no teu bordado;
Avultava, num largo arborizado,
Uma estátua de rei num pedestal.

Sorriam, nos seus trens, os titulares;
E ao claro sol, guardava-te, no entanto,
A tua boa mãe, que te ama tanto,
Que não te morrerá sem te casares!

Soberbo dia! Impunha-me respeito
A limpidez do teu semblante grego;
E uma família, um ninho de sossego,
Desejava beijar sobre o teu peito.

Com elegância e sem ostentação,
Atravessavas branca, esbelta e fina,
Uma chusma de padres de batina,
E de altos funcionários da nação.

"Mas se a atropela o povo turbulento!
Se fosse, por acaso, ali pisada!"
De repente, paraste embaraçada
Ao pé dum numeroso ajuntamento.

E eu, que urdia estes fáceis esbocetos,
Julguei ver, com a vista de poeta,
Uma pombinha tímida e quieta
Num bando ameaçador de corvos pretos.

E foi, então, que eu, homem varonil,
Quis dedicar-te a minha pobre vida,
A ti, que és ténue, dócil, recolhida,
Eu, que sou hábil, prático, viril.

 

Novembro, 1876

 

In “O Livro de Cesário Verde”

Typographia Elzeveriana – Lisboa – 1887

 

Cesário Verde

1855 - 1886

 

publicado por cateespero às 00:00
link do post | Deixe seu comentário | ver comentários (1) | favorito
Terça-feira, 13 de Março de 2012

Eu li... Mário Quintana

OS POEMAS

 

Os poemas são pássaros que chegam
não se sabe de onde e pousam
no livro que lês.
Quando fechas o livro, eles alçam voo
como de um alçapão.
Eles não têm pouso
nem porto;
alimentam-se um instante em cada
par de mãos e partem.
E olhas, então, essas tuas mãos vazias,
no maravilhado espanto de saberes
que o alimento deles já estava em ti...


In “Esconderijos do Tempo”

L&PM Editores

 

Mário Quintana

1906 – 1994

(Poeta Brasileiro)

 

publicado por cateespero às 00:00
link do post | Deixe seu comentário | favorito
Quinta-feira, 8 de Março de 2012

Eu li... Florbela Espanca

A NOITE DESCE...

Como pálpebras roxas que tombassem
Sobre uns olhos cansados, carinhosas,
A noite desce... Ah! doces mãos piedosas
Que os meus olhos tristíssimos fechassem!

Assim mãos de bondade me embalassem!
Assim me adormecessem, caridosas,
E em braçadas de lírios e mimosas,
No crepúsculo que desce me enterrassem!

 
A noite em sombra e fumo se desfaz...
Perfume de baunilha ou de lilás,
A noite põe-me embriagada, louca!

E a noite vai descendo, muda e calma...
Meu doce Amor, tu beijas a minh’alma
Beijando nesta hora a minha boca!

 

 

 

In “Livro de Soror Saudade” – Sonetos

Colecção Autores Portugueses de Ontem

Livraria Estante Editora – Junho de 1988

 

Florbela Espanca

1894 – 1930

publicado por cateespero às 00:00
link do post | Deixe seu comentário | favorito
Sexta-feira, 2 de Março de 2012

Eu li... João Penha

ENTRE MUNDANAS

 

- “Filha das tristes ervas, nus os pés

Andrajosa, mas bela de semblante,

Seduziu-me um devasso, um falso amante,

E nada tinha que perder aos dez.”

 

“Fui actriz, e cantora de cafés,

Mas, mudava, indecisa, a cada instante,

Depois fui o que sou: mundana ovante,

Com trem montado, alto estadão, librés.”

 

“Mas tu, que eras um anjo, um serafim!

És, pois, de quem te queira! Que piedade!

E porquanto te dás?” – “Por um sequim.”

 

- “Por um sequim em plena mocidade!

De dia e noite uma tarefa assim!

Tu rebaixas a nossa dignidade!”

 

 

In “Ecos do Passado” – 1914

Companhia Portuguesa Editora – Porto

 

João Penha

1838 – 1919

publicado por cateespero às 00:00
link do post | Deixe seu comentário | favorito

.Eu

.pesquisar

 

.Maio 2017

Dom
Seg
Ter
Qua
Qui
Sex
Sab
1
2
3
4
5
6
7
8
9
10
11
12
13
14
15
16
17
18
19
20
21
22
23
24
25
26
27
28
29
30
31

.posts recentes

. Eu li...

. Eu li... Olavo Bilac

. Eu li... António Botto

. Eu li... Charles Baudelai...

. Eu li... Su Dongbo

. Eu li... Jacinta Passos

. Eu li... Laura Riding

. Eu li... Carlos Drummont ...

. Eu li... Juan Ramón Jimén...

. Eu li... Vincenzo Cardare...

.arquivos

. Maio 2017

. Abril 2017

. Março 2017

. Fevereiro 2017

. Janeiro 2017

. Dezembro 2016

. Novembro 2016

. Outubro 2016

. Setembro 2016

. Agosto 2016

. Julho 2016

. Junho 2016

. Maio 2016

. Abril 2016

. Março 2016

. Fevereiro 2015

. Janeiro 2015

. Dezembro 2014

. Novembro 2014

. Outubro 2014

. Setembro 2014

. Agosto 2014

. Julho 2014

. Junho 2014

. Maio 2014

. Abril 2014

. Março 2014

. Fevereiro 2014

. Janeiro 2014

. Dezembro 2013

. Novembro 2013

. Outubro 2013

. Setembro 2013

. Agosto 2013

. Julho 2013

. Junho 2013

. Maio 2013

. Abril 2013

. Março 2013

. Fevereiro 2013

. Janeiro 2013

. Dezembro 2012

. Novembro 2012

. Outubro 2012

. Setembro 2012

. Agosto 2012

. Julho 2012

. Junho 2012

. Maio 2012

. Abril 2012

. Março 2012

. Fevereiro 2012

. Janeiro 2012

. Dezembro 2011

. Novembro 2011

. Outubro 2011

. Setembro 2011

. Agosto 2011

. Julho 2011

. Junho 2011

. Maio 2011

. Abril 2011

. Março 2011

. Fevereiro 2011

. Janeiro 2011

. Dezembro 2010

. Novembro 2010

. Outubro 2010

. Setembro 2010

. Agosto 2010

. Julho 2010

. Junho 2010

. Maio 2010

. Abril 2010

. Março 2010

. Fevereiro 2010

. Janeiro 2010

. Dezembro 2009

. Novembro 2009

. Outubro 2009

. Setembro 2009

. Agosto 2009

. Julho 2009

. Junho 2009

. Maio 2009

. Abril 2009

. Março 2009

. Fevereiro 2009

. Janeiro 2009

. Dezembro 2008

. Novembro 2008

. Outubro 2008

. Setembro 2008

. Agosto 2008

. Julho 2008

. Junho 2008

. Maio 2008

. Abril 2008

. Março 2008

.tags

. todas as tags

blogs SAPO

.subscrever feeds