O LIVRO DOS AMANTES
I
Glorifiquei-te no eterno.
Eterno dentro de mim
fora de mim perecível.
Para que desses um sentido
a uma sede indefinível.
Para que desses um nome
à exactidão do instante
do fruto que cai na terra
sempre perpendicular
à humidade onde fica.
E o que acontece durante
na rapidez da descida
é a explicação da vida.
II
Harmonioso vulto que em mim se dilui.
Tu és o poema
e és a origem donde ele flui.
Intuito de ter. Intuito de amor
não compreendido.
Fica assim amor. Fica assim intuito.
Prometido.
VI
Aumentámos a vida com palavras
água a correr num fundo tão vazio.
As vidas são histórias aumentadas.
Há que ser rio.
Passámos tanta vez naquela estrada
talvez a curva onde se ilude o mundo.
O amor é ser-se dono e não dar nada.
Mas pede tudo.
IX
Pusemos tanto azul nessa distância
ancorada em incerta claridade
e ficamos nas paredes do vento
a escorrer para tudo o que ele invade.
Pusemos tantas flores nas horas breves
que secam folhas nas árvores dos dedos.
E ficámos cingidos nas estátuas
a morder-nos na carne dum segredo.
In “Poemas” – 1955
Natália Correia
1923 – 1993
SONETO DE AMOR
Não me peças palavras, nem baladas,
nem expressões, nem alma... Abre-me o seio,
deixa cair as pálpebras pesadas,
e entre os seios me apertes sem receio.
Na tua boca sob a minha, ao meio,
nossas línguas se busquem, desvairadas...
E que os meus flancos nus vibrem no enleio
das tuas pernas ágeis e delgadas.
E em duas bocas uma língua..., – unidos,
nós trocaremos beijos e gemidos,
sentindo o nosso sangue misturar-se…
Depois... – Abre os teus olhos, minha amada!
Enterra-os bem nos meus; não digas nada...
Deixa a Vida exprimir-se sem disfarce!
(Biografia)
In “Antologia de Poesia Portuguesa Erótica e Satírica”
Selecção, prefácio e notas de Natália Correia
5ª edição - Antígona/frenesi
José Régio
1901 – 1969
PONTOS DE VISTA
Na minha infância, quando eu me excedia,
quando eu fazia alguma coisa errada,
se alguém ralhava, minha mãe dizia:
– Ele é criança, não entende nada!
Por dentro, eu ria satisfeito e mudo.
Eu era um homem, entendia tudo.
Hoje que escrevo histórias e poemas
e pareço ter tido algum estudo,
dizem quando me vêem com meus problemas:
– Ele é um homem, ele entende tudo!
Por dentro, alma confusa e atarantada,
eu sou uma criança, não entendo nada!...
Giuseppe Ghiaroni
(Poeta e Jornalista Brasileiro)
1919 – 2008
ADOLESCENTE
Eu ontem passei o dia
Ouvindo o que o mar dizia.
Chorámos, rimos, cantámos.
Falou-me do seu destino.
Do seu fado…
Depois para se alegrar,
Ergueu-se, e bailando, e rindo,
Pôs-se a cantar
Um canto molhado e lindo.
O seu hálito perfuma –
E o seu perfume faz mal!
Deserto de águas sem fim…
Ó sepultura da minha raça,
Quando me guardas a mim?...
Ele afastou-se calado;
Eu afastei-me mais triste,
Mais doente, mais cansado…
Ao longe, o Sol, na agonia,
De roxo as águas tingia.
– Voz do mar misteriosa;
Voz de amor e de verdade!
Ó voz moribunda e doce
Da minha grande saudade!
Voz amarga de quem fica,
Trémula voz de quem parte…
………………………………….
E os poetas a cantar
São ecos da voz do mar!
In “Canções” – 1921
António Botto
1897 – 1959
UM DIA
Esvoaçam os pardais a chilrear,
são puras as cores, o dia já nasceu.
Mergulham no azul fresco do céu,
onde o Sol, desde cedo está a reinar.
Vem a tarde, e apetece caminhar,
sem ter destino certo, pelos montes…
E ao subi-los em silêncio, ouvem-se as
[fontes,
Que cantam noite e dia, sem parar.
Mas o Sol, pouco a pouco, vai descendo,
e o dia, cansado, vai morrendo
nos braços de uma noite de luar…
Luar que a Lua espalha como um véu,
sobre a Terra que há pouco adormeceu,
e que amanhã, com o Sol, volta a acordar.
In “Revista Unearta”
Ano I – N.º 1 – Janeiro 2002
Eugénio Pinto Aires
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