TRAZ OUTRO AMIGO TAMBÉM
Amigo
Maior que o pensamento
Por essa estrada amigo vem
Não percas tempo que o vento
É meu amigo também
Em terras
Em todas as fronteiras
Seja bem-vindo quem vier por bem
Se alguém houver que não queira
Trá-lo contigo também
Aqueles
Aqueles que ficaram
(Em toda a parte
todo o mundo tem)
Em sonhos me visitaram
Traz outro amigo também
In "Traz Outro Amigo Também" – 1970
José Afonso
1929 – 1987
CÁ DENTRO E TÃO PERDIDO
Sei de um mundo de luz onde os poetas,
Despidos dos humanos preconceitos,
Viajam pelo espaço entre os eleitos
Como estrelas do céu, como cometas...
Por esse mundo a alma, essa inquieta,
Etérea como a luz, esquece os defeitos
E rodopia em círculos perfeitos
De fórmula geométrica e secreta...
Eu sei de um mundo mágico e seguro
Onde cada presente é um futuro,
Onde a terrena dor não faz sentido...
Sei desse mundo porque já lá estive
E a imagem dele ´inda em mim vive
Dentro de mim. Cá dentro e tão perdido...
In “Poeta Porque Deus Quer”
1ª edição – Janeiro.2009
Autores Editora
Maria João Brito de Sousa
N. 1952
PERGUNTA
Quem vem de longe e sabe o nome do meu lugar
e levou o caminho das conchas em mar
e dos olhos em rio
– quem vem de longe chorar por mim?
Quem sabe que eu findo de dureza
e condensa ternura em suas mãos
para a derramar em afagos
por mim?
Quem ouviu a angústia do meu brado,
sirene de um navio a vadiar no largo,
e me traz seus beijos e sua cor,
perdendo-se na bruma das madrugadas
por mim?
Quem soube das asperezas da viagem
e pediu o pão negado
e o suor ao corpo torturado,
por mim? por mim?
Quem gerou o mundo e lhe deu seu nome
e seu tamanho – imenso, imenso,
e em mim cabe?
In "Mar de Sargaços"
Fernando Namora
N. 1919
O SONHO
Pelo sonho é que vamos,
Comovidos e mudos.
Chegamos? Não chegamos?
Haja ou não frutos,
Pelo Sonho é que vamos.
Basta a fé no que temos.
Basta a esperança naquilo
Que talvez não teremos.
Basta que a alma demos,
Com a mesma alegria, ao que é do dia-a-dia.
Chegamos? Não chegamos?
– Partimos. Vamos. Somos.
In "Pelo Sonho é que Vamos"
Sebastião da Gama
1924 – 1952
SILÊNCIO
Assim como do fundo da música
brota uma nota
que enquanto vibra cresce e se adelgaça
até que noutra música emudece,
brota do fundo do silêncio
outro silêncio, aguda torre, espada,
e sobe e cresce e nos suspende
e enquanto sobe caem
recordações, esperanças,
as pequenas mentiras e as grandes,
e queremos gritar e na garganta
o grito se desvanece:
desembocamos no silêncio
onde os silêncios se emudecem.
Libertad bajo palabra, 1960
In “Antologia Poética – Poesia Século XX”
Tradução de Luís Pignatelli
Publicações Dom Quixote – 1984
Octavio Paz
1914 – 1998
(Poeta Mexicano)
SER POETA
Ser poeta é ser mais alto, é ser maior
Do que os homens! Morder como quem beija!
É ser mendigo e dar como quem seja
Rei do Reino de Aquém e Além Dor!
É ter de mil desejos o esplendor
E não saber sequer que se deseja!
É Ter cá dentro um astro que flameja
É ter garras e asas de condor!
É Ter fome, é Ter sede de Infinito!
Por elmo, as manhãs de oiro e de cetim...
É condensar o mundo num só grito!
E é amar-te, assim perdidamente...
É seres alma, e sangue, e vida em mim
E dizê-lo cantando a toda gente!
In “Sonetos”
Estante Editora
Florbela Espanca
1894 – 1930
OUVE, MEU ANJO
Ouve, meu anjo:
Se eu beijasse a tua pele?
Se eu beijasse a tua boca
onde a saliva é mel?
Calmo, tentou, afastar-se
Num sorriso desdenhoso;
Mas aí,
– a carne do assassino
É como a do virtuoso.
Numa atitude elegante,
misterioso, gentil,
deu-me o seu corpo doirado
que eu beijei quase febril.
Na vidraça da janela,
a chuva, leve, tinia...
Ele apertou-me cerrando
os olhos para sonhar –
e eu lentamente morria –
como um perfume no ar!
In "Canções"
António Botto
1897 – 1959
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